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Novas perspectivas ....

O BRANCO QUE VIROU ÍNDIO

De: Gabriela de Araújo Farias (1)

Era noite, os pais de Carlos choravam ao pé da sua cama já perdendo as esperanças de que seu filho ficasse bom de uma pneumonia que já estava em estado bastante grave. Eles só aguardavam a confirmação de um vôo para que pudessem embarcar para São Paulo. Foi dada a confirmação e a família partiu. Quanto o jato chegou na área da floresta amazônica, foi constatado uma falta de combustível a qual fez com que o piloto tentasse um pouso de emergência e o jato caiu mata a dentro.

Do acidente se salvaram Carlos e sua mãe, mas infelizmente seu pai e o piloto não conseguiram sair do jato e morreram com a explosão. Carlos estava muito fraco e já não conseguiu mais andar. A mata estava muito escura e as nuvens que cobriam a lua se preparavam para chover. Então sua mãe, Marta, conseguiu levá-lo para debaixo de uma grande árvore que os protegeu durante a noite escura e chuvosa.

No outro dia, quando Marta se acordou, já não se via debaixo da árvore na qual dormira a noite passada; estava deitada em uma espécie de rede dentro de um pequeno casebre, e por mais que procurasse, não conseguia ver Carlos. Onde será que ele estaria? Como será que ela havia parado lá naquele local que nunca havia visto em sua vida? As dúvidas de Marta foram maiores quando viu aquela pequena criança morena, de cabelos lisos e escuros, que apareceu na porta do casebre, era um curumim. Ele vinha trazer notícias de Carlos, o seu filho. Mas Marta não achou nada bom em saber que ele estava sob os cuidados do Pajé da tribo indígena na qual estava.

E começou a dizer apavorada:

"Onde está o meu filho? Eu quero o meu filho!

Vocês não podem fazer nada por ele, vocês não entendem nada de medicina e da cura de doenças! Tire suas mãos de cima do meu filho! Eu quero sair daqui o mais rápido possível!"

Mas, apesar de todo o escândalo que Marta fez, os índios que estavam cuidando de Carlos não deram ouvidos a ela. Eles sabiam que a fase da doença da criança já estava ultrapassada e estavam só aguardando a chegada das ervas preciosas para fazer o remédio para a cura da doença de Carlos.

Marta estava tão desesperada que achou que os índios queriam matar seu filho. Ela era uma pessoa que não dava valor não só à medicina indígena, mas também à cultura, à crença e à religião dos índios. Mas não sabia que eles tinham a cura para quase tudo ou que sabe tudo, e esqueceu de lembrar também que ela estava sendo uma pessoa muito sortuda em ser acolhida tão bem pelos índios, aqueles que desde que foram encontrados, sofrem até hoje nas mãos de nós "brancos", e que eles não sofrem só com o problema da desvalorização de sua cultura e de sua vida, mas também nas mãos de jovens delinqüentes que matam índios inocentes queimados, ou nas mãos do governo que não toma nenhuma providência para que desgraças não aconteçam com os índios, nas mãos de um governo que só age com intenções particulares e interesseiras e que não pensa nem um pouco sequer em palavras simples como solidariedade e amor, é tanto que hoje os índios existentes em nosso país, são muito poucos em relação aos que existiam.

Depois de muito apavoramento, Marta percebeu que aqueles índios só estavam querendo a ajudar. Salvando a vida de seu filho Carlos. Então, deixou que eles cuidassem dele.

Dois dias depois, os grupos de busca encontraram os destroços do jato, mas levaram ainda um dia para achar Marta e seu filho. Com aqueles três dias na tribo da Amazônia, Marta notou que as tribos de hoje em dia não são mais do jeito que ela imaginava, agora os índios moram em casas e não em ocas, agora os índios andam vestidos e não nus e pintados como era antes, e, conforme é sua cultura, ela notou que os índios agora não são somente índios e sim uma mistura de índio com caras pálidas, como eles nos chamam.

Depois daquela reflexão feita por Marta, ela não só descobriu coisas como tomou decisões. Ela não só tomou decisões, como agradeceu aos índios antes de partir para casa por terem salvado a vida de Carlos e prometeu ajuda. Logo depois partiu com seu filho tão precioso que agora não era só seu filho mas de certa forma filho de todos aqueles índios que foram tão bons com ele.

Cinco anos depois de muito trabalho, Marta voltou ao local da tribo para fazer pesquisas sobre eles, e tentar os ajudar. Mas, ao chegar lá não viu mais nada além de tristeza e dor. Aquela tribo já não estava mais lá. Como aquilo aconteceu, ninguém sabia, a sensação de Marta foi revoltante. Ela ficou muito triste em saber como existiam pessoas no mundo que não sabiam o quanto eram cruéis, e que não tinham conhecimento do tesouro que estavam perdendo.

Ao retornar a sua cidade, Marta resolveu escrever sua história e fazer um livro. Seu livro fez bastante sucesso, e Marta foi bastante procurada e entrevistada, em suas entrevistas ela sempre tentava passar para o público que escrevera aquele livro para que as pessoas tomassem conhecimento do que estavam perdendo, e que não estava preocupada com sua fama, mas sim com um de nossos maiores tesouros, os índios, e que estamos todos errados em relação a esse assunto, e que se cada um não fizer sua parte quando decidirmos fazer já vai ser tarde demais.

Um ano depois Marta decidiu também lutar pelos direitos dos índios. Fez várias pesquisas além de outros livros, conheceu novas tribos e novas histórias. Mas, infelizmente, quando Carlos tinha quinze anos sua mãe Marta foi assassinada pelo homem que foi responsável pelo desastre daquela tribo da Amazônia e que a salvara juntamente com seu filho do acidente, e por isso ela o processou.

Apesar da dor e do medo de continuar o trabalho de sua mãe, Carlos enfrentou e enfrenta até hoje obstáculos que sempre aparecem para impedir de lutar pela valorização dos índios.

(1) Gabriela de Araújo Farias, de Campina Grande – Pb., é Estudante da 7ª série.