Espaço Cultural
do Povo
Xukurú do
Ororubá

 

Viagem ao POVO XUKURU : 13 a 15 / 12 no Povo Xukuru

 


A razão da viagem e os preparativos:


Esta viagem foi programada em vista do convite feito por Aloys ao Prof. Dr. Manfred Nitsch, seu orientador de doutorado, durante os seus estudos na universidade de Bremen, no período de 1980 a 1985, na Alemanha. Uma vez que a tese de pesquisa foi O Direito dos Índios no Brasil - com aspecto especial à questão da terra, (do período da 'descoberta' do Brasil até a atualidade) tinha feito o convite para conhecer, mais de perto, aquele povo indígena no qual ele trabalha, desde 1980. Aloys sempre está em contato com a causa indígena, mas principalmente com o povo Xukuru do Ororubá, no qual ele discutia e discute ainda hoje com as lideranças, como também participa, através de freqüentes encontros, da vida comunitária em busca de soluções das muitas problemáticas. Ficou chocado com as constantes ameaças de morte e, sobretudo, com os brutais assassinatos de 7 indígenas Xukuru, portanto, problemas tanto existentes como também os quais surgiram e ainda surgem, sempre de maneira imprevista, e representando-se sempre urgentes e trazendo várias, mas sempre sérias, ameaças aos indígenas.

O Prof. Manfred, que lhe ajudara de maneira muito pedagógica, como também fraterna, embora sempre bastante exigente, assim como lhe mostrava e ensinava tanto a maneira de estudar, como também de compreender as questões legais, portanto de efetuar um estudo crítico e criativo, para que servisse também aos povos indígenas de maneira geral e especificamente em questões referentes às suas terras.

Portanto, em razão disto, Manfred tinha informado no ano passado (2002) que não podia atender o seu convite durante aquele ano, mas colocaria como prioritário para o ano de 2003.

Quando confirmava a sua consultoria, dentro da programação pelo Banco Mundial, a ser realizado durante o mês de dezembro, em Brasília, informou e confirmou o seu interesse de visitar a "nova terra", especialmente de conhecer o povo Xukuru.

Em vista disto, elaboramos a nossa programação, tendo como objetivo principal uma visita ao povo Xukuru e tendo ainda a possibilidade de conhecer mais alguma coisa do Nordeste. A partir daí, foram feitos os entendimentos com as lideranças do povo Xukuru que nos alertavam sobre a situação tensa (e perigosa) de trazer uma autoridade neste clima de ameaças de morte de suas lideranças. Mas, devido à insistência de Aloys, programamos esta visita para os dias 13/12 (Sábado) a 15/12 (segunda-feira), sendo os restantes dias (16 e 17) terça e quarta-feira, para conhecer um pouco da história do Nordeste, visitando pontos históricos de Olinda e Recife.

Em função da situação tensa e bastante perigosa para nossa "excursão", pedimos ao companheiro Ângelo Bueno, missionário do CIMI - (Conselho Indigenista Missionário) do Nordeste - para vir alguns dias antes para o povo Xukuru, a fim de efetuar os devidos preparativos, inclusive informar em detalhes quem seriam os componentes desta nossa visita, como também quais seriam os nosso objetivos.

Vale salientar que o Ângelo Bueno fez e ainda está fazendo um excelente trabalho no meio do povo Xukuru, especialmente no meio de suas lideranças, embora que na hora da nossa chegada estava, juntamente com o vice-presidente Nacional do CIMI, o indigenista Saulo Feitosa, em visita ao povo Truká, se ausentando para atender um chamado urgente deste povo indígena (? 400 km distante do povo Xukuru) para discutir, juntamente com as lideranças do povo Truká quais medidas a serem tomadas para resolver a grave situação devido a diversas agressões sofridas pelas autoridades locais, municipais, regionais e federais. Ângelo voltou da sua missão no domingo e ainda participou de algumas das nossas atividades.


Os participantes da excursão e seus objetivos:


Paulo Eduardo - sobrinho de Aloys (Proprietário e Motorista do carro tipo "Van"); Ana Sávia - sobrinha de Aloys; André, filho de Aloys, todos os três estudantes universitários, (Paulo Eduardo estudo História na UFCG, Ana Sávia Ciências Sociais também na UFCG e André realiza sua pesquisa no Mestrado em Políticas Pública na UFRN, enquanto Aloys é Prof. aposentado; estes todos de Campina Grande.

Além desses, o Prof. Dr. Manfred Nitsch, da Universidade Livre de Berlim; Profª. M.ª Elisa da Cruz, do Deptº de Serviço Social, da Universidade Federal de Sergipe; e ainda Francisco Siqueira, funcionário do SERTA (Serviço de Tecnologia Alternativa) e indigenista há muitos anos e profundo conhecedor do povo Xukuru.

Condição de participação desta viagem: todos os componentes do grupo visitante são da confiança dos organizadores deste encontro, que, por sua vez, gozam da confiança das lideranças do povo Xukuru.

Objetivo: apresentar ao Prof. M. Nitsch e a Profª. Elisa as lideranças do povo Xukuru, para que, desta maneira, tanto pelos contatos pessoais como pela convivência neste ambiente, pudessem conhecer e sentir mais de perto algumas características das tradições e costumes deste povo.

Itinerário da viagem de ida: Campina Grande ? Recife ? Caruaru ? São Caetano ? Belo Jardim ? Pesqueira ? Serra do Ororubá (onde vive o Povo Xukuru).

Enquanto a volta Pesqueira ? Sanharó ? Belo Jardim ? São Caetano ? Caruaru ? Glória de Goitá ? Recife ? Campina Grande.

Total de quilômetros percorridos: 1.097


A viagem até o Povo Xukuru:


Sábado:


No Sábado, dia 13 de dezembro, nós, Paulo Eduardo, Ana Sávia, André e Aloys, saímos às 7.30 hs. de Campina Grande, em direção a Recife. Às 11.30 h. chegamos no Hotel 'Mar Hotel', localizado em Boa Viagem, na cidade de Recife, onde, por sua vez, Francisco Siqueira, já nos estava esperando. No Hotel, tanto o Prof. Manfred, como a Profª. Elisa já estavam a nossa espera. Após os costumeiros comprimentos e uma ligeira troca das novidades, iniciamos a nossa viagem em direção ao Povo Xukuru.

Depois de termos parados num restaurante na estrada desta BR, em São Caetano, pois, nesta altura, já eram quase 14 hora,. chegamos por volta de 16 horas na cidade de Pesqueira, de onde, por telefone, avisamos o ponto de nossa chegada .

Passando pela cidade de Pesqueira, paramos no ponto mais alto desta cidade, no Cruzeiro, que fica ao pé da Serra do Ororubá onde se há uma boa visão da cidade. Tiramos algumas fotos, também da construção de um santuário, que está sendo erguido porque o povo Xukuru não está permitindo a construção de um Centro turístico em redor do histórico Santuário de Nossa Senhora das Graças, na aldeia da Guarda. Com toda a resistência possível o povo Xukuru. tenta impedir qualquer comercialização da religião e, aqui, da Santa Mãe de Deus e dos Homens, Nossa Senhora das Graças. Qualquer pessoa pode visitar este santuário de Nª Sr.ª das Graças, mas os indígenas proíbem veementemente qualquer comércio em redor ou a partir da religião e/ou de seus santos.

Logo, em seguida, tínhamos na nossa frente a placa que marca da divisória em redor do povo Xukuru: A placa diz em letras grande e bem estampadas:


FUNAI avisa:


RESERVA INDÍGENA

 

- Território Reservado -

 

ENTRADA PROIBIDA !!



Visita ao Povo Xukuru:


Depois de uns dois km pela estrada asfaltada, que vai até a Vila de Cimbres, fomos pela subida que vai para a casa de D. Zenilda, a viúva do antigo cacique assassinado, o grande líder, Xicão Xukuru, na casa de D. Zenilda, fizemos inicialmente a apresentação dos visitantes.

Fomos informados com algumas primeiras colocações sobre a atual situação no povo Xukuru: angústia, medo e insegurança pela atuação do delegado (nomeado pelo Ministério da Justiça), encarregado para dar segurança de vida (contra as ameaças de morte) ao cacique e à D. Zenilda. Entretanto, o mesmo delegado (da Polícia Federal), encarregado de dar e garantir a segurança, também é indicado (nomeado formalmente) para presidir o inquérito que investiga (acusa imoralmente) o cacique Marquinho como tendo sido o mandante do assassinato dos dois companheiros dele, na última emboscada no qual estes dois (que estavam sendo os companheiros de Marquinho) foram brutalmente assassinados para salvar e dar cobertura ao cacique Marquinho.

D. Zenilda nos pediu com muita firmeza para que todos nós visitantes tivéssemos o máximo de cuidado, pois o delegado (com a sua turma de proteção - estando todos armados) estavam na área para efetuar os inquéritos, conseguindo com que todo mundo ficasse inseguro e com medo. Houve falsas acusações contra os Xukuru, principalmente contra suas lideranças e os inimigos não cansaram, pois até compraram várias testemunhas para inventar e afirmar falsas acusações contra estes.

Pois, nos inquéritos efetuados, após a morte do indígena Xukuru Chico Qelé, acontecia como resultado que alguns ficassem presos e levados para a cadeira - como ocorreu no caso da "prisão preventiva" imposta contra os indígenas Xukuru Dandão (liderança) e Zé de Santa (Vice-Cacique) que, atualmente, estão com habeas corpus decidido pelo Juiz do Supremo Tribunal Federal, em Brasília.

Depois destes primeiros contatos com algumas das lideranças, Marquinho nos levou para sua casa que, atualmente, está sendo na antiga "Fazenda Santa Clara", hoje espaço recuperado pelo povo Xukuru. Este novo espaço do povo Xukuru que fica localizado na beira da estrada asfaltada (que leva para a Vila de Cimbres), está sendo usado como local de grandes encontros. Assim foi realizado quinze dias atrás, o encontro sobre educação (com todos os professores, lideranças e demais envolvidos na educação do povo),

com 190 participantes. Nos acomodamos nos diversos quartos e, após um banho refrescante, jantamos e já ficamos aguardando as próximas surpresas.

Fomos convidados a prestigiar e assistir a festa da formatura dos concluintes da 8ª série. Inicialmente achamos este convite um pouco estranho, pois nas nossas realidades, não há o costume de fazer uma festa de formatura do curso fundamental. Desta maneira cada um de nós ficou numa certa expectativa do que iria ocorrer e como seria organizada e conduzida esta formatura.

A sala estava bem ornamentada e tinha umas 30 mesas, todas decoradas, além de conterem bebidas, refrigerante e champanhe. Nós notamos, também, que a nossa mesa era a dos convidados, portanto do pessoal de honra. Todos nos cumprimentavam e trocavam algumas palavras conosco, apesar que somente Chico, André e Aloys eram conhecidos.

A festa foi iniciada com a composição da mesa das autoridades, anunciada por uma professora bem descontraída, que tentava amenizar o nervosismo existente entre os formandos, pois falava bem animada e dava sempre mais novas e agradáveis informações sobre a importância deste acontecimento. Como primeiro componente da mesa e, ao mesmo tempo, como paraninfo geral desta turma formanda, foi convidado o Cacique do povo Xukuru, o corajoso e jovem Marquinho (hoje com 25 anos de idade). Este sentou-se no centro da mesa, ocupando a cadeira principal. Em seguida foram convidados o Vice-Cacique, D. Zenilda, várias lideranças presentes, o coordenador da área de educação, o representante da coordenação de saúde, o presidente da Associação do Povo Xukuru, como ainda várias outras autoridades presentes. Durante todo este cerimonial havia um fundo musical suave, agradável em ritmo de dança indígena.

O Cacique Marquinho, abriu a solenidade mostrando e destacando tanto o eficiente trabalho realizado pelos professores responsáveis pelo ensino fundamental no povo Xukuru, enfatizando que todos são comprometidos com a cultura, os costumes, as tradição deste povo. Falou, ainda, de se sentir orgulhoso e poder presidir esta festividade, pois tem um grande significado para todo o povo e, principalmente, para o seu futuro. Antes de encerrar a sua fala convidou os visitantes para a mesa diretora. Apresentou cada um de nós e pediu a Aloys continuar nesta apresentação. E assim, Aloys, continuando o uso de sua palavra destacava o papel que cada um desempenhou até chegar a este momento. Citou e mostrou o grande educador do povo Nordestino, o pedagogo Paulo Freire, que infelizmente é mais conhecido nos países estrangeiros do que na própria pátria, mas que nesta realidade e neste corajoso povo indígena teve sua lição realizada o que comprova, de maneira especial, esta turma de formandos e formados, de lideranças e responsáveis do meio deste povo perseguido, mas sempre vitorioso. Então foi a vez de André apresentar os seus parabéns a todos os formandos e dando especial ênfase à juventude de cada um, independente de idade. Juventude é antes de tudo, o estado de espírito de cada um de nós e também da responsabilidade de cada um, dizia ele numa firmeza impressionante. A Profª. Elisa, então, falou um pouco de suas experiências como educadora em Sergipe. As suas palavras eram animadoras para todos os presentes, embora tentando abrir mais os olhos para as grandes e graves responsabilidades que esperam, aguardando para serem assumidos por cada um, cada um nos seu respectivo lugar de vida e trabalho. Em seguida falou o Prof. Manfred falou num português bem compreensível da importância de cada cidadão em assumir e semear sempre mais cidadania entre todos os seus vizinhos e compatriotas. Congratulou-se em poder, não somente assistir, mas participar de uma formatura tão cordial como sincera e intimadora, mostrando com toda a clareza que o importante é não somente saber de sua responsabilidade, mas sim, de cumpri-la na vida diária, dura e difícil de cada um. Finalmente falou o conhecido Chico. Impressionante foi quando este destacou o orgulho de cada um dos presentes nesta festa. Orgulho de ser Xukuru, como também de ser amigo destes. Ainda falava da implicação deste orgulho para cada um e que é preciso fazer com que este orgulho nunca diminua, pelo contrário que seja sempre mais contagioso e contagiante, pois assim teremos a garantia absoluta que seremos vitoriosos e contribuiremos para um mundo melhor tanto aqui, no lugar de trabalho e vida de cada um, como em todas as regiões desta pátria e no mundo inteiro. Depois o Cacique retomou a palavra, dando continuação ao cerimonial, pela entrega do diploma a cada um dos formandos.

Cada um dos formandos estava acompanhado pelo seu respectivo padrinho ou madrinha e este entregava o diploma ao seu afilhado. Foram tiradas muitas fotos. Em seguida, começou o baile de formatura, inicialmente somente dos formados com seus padrinho, seguindo, então, por todos que gostavam de se exercer nestes ritmos tocados.

Enfim, foi uma festa muito bonita e bastante animadora para todos os presentes e, principalmente, para cada um de nós, visitantes e convidados de honra.


Depois desta festa fomos para a casa de Marquinho, onde ainda conversamos um pouco. Então Manfred informou ao Cacique que foi incumbido, pela Ministra para Cooperação Internacional, do Governo Federal da Alemanha, a Sr.a Heidi Wieczorek-Zeul, que conheceu o cacique num encontro na capital brasileira, Brasília de, além de transmitir a Marquinho suas saudações pessoais, também sua preocupação com a situação dele e do povo todo. Além disso, o Prof. Manfred se prontificou em elaborar um relatório sobre esta visita ao Povo Xukuru, e, em especial, relatar a questão da segurança do amigo Cacique Marquinho e das outras lideranças.

Manfred colocou, então, que fará o relatório desta visita e que Marquinho pode ter toda a certeza que o seu relato também destacará a questão da insegurança, reinando no meio de seu povo, provocada pelas autoridades que deveriam cuidar e fazer com que todos pudessem viver em harmonia conforme os seus costumes, tradições e responsabilidades assumidos publicamente, como também do impressionante orgulho de seus membros e ainda da convicção que eles mesmos são os responsáveis pelo seu destino e progresso, mesmo com todas as dificuldades e empecilhos colocados e ainda vindouros.


Então fomos dormir para acordar no outro dia, domingo, dia 14 de 12, ? às 6 horas.


Domingo:

 

Logo cedo, ? às 5.30h, Aloys fez seu costumeiro passeio pela redondeza. Foi interessante como, tão cedo já tinha vários Xukuru cuidando dos seus canteiros de verdura e preparando a roça, pois, tradicionalmente, já é época das primeiras chuvas, que, entretanto, neste ano estão tardando muito. Mesmo assim na falta de chuva, os indígenas preparam a sua roça, para poder plantar milho e feijão, pois tem muita confiança que este ano vindouro vai ser de uma boa safra.

Depois do café, este preparado por D. Zenilda com muito carinho e competência, pois ela mesma se encarregava da cozinha, fomos convidados para visitar a aldeia Pedra d'água, onde fica localizada a Pedra do Rei, o cume mais alto da Serra do Ororubá e, ao mesmo tempo, o lugar mais sagrado para as realizações dos rituais solenes deste povo.

Ao pé da Pedra do Rei, dentro de uma mata vistosa, verde, podendo ser considerada, uma mata selvagem, pois que não é mata virgem, visto que foi derrubada muitas vezes pelos invasores, o próprio Xicão - o Grande Cacique que conseguiu reerguer o seu povo - , quando ainda em vida, solicitara ser enterrado neste local.

O Cacique Xicão (Esposo de D. Zenilda e Pai de Marquinho) foi assassinado brutalmente no dia 20 de maio de 1998 e até hoje a Justiça não conseguiu punir nenhum dos assassinos, muito menos os mandantes deste crime bárbaro.

Para se chegar ao túmulo de Xicão passa-se por uma vasta região montanhosa, cheio de pedras, com vegetação baixa e muitos cactos. Andando nesta montanha para baixo, chega-se ao túmulo do grande herói e mártir do povo Xukuru. Existe aqui, como se fosse uma separação voluntária, uma interrupção desta vegetação baixa, tipicamente montanhosa, para dar lugar a uma floresta, de árvores altas e frondosas. No meio destas árvores majestosas o Xicão foi sepultado.

Neste lugar do túmulo, respira-se como se fosse um clima diferente, um ar diferente -. Tudo aqui é diferente, numa palavra, o visitante sente-se como sendo obrigado para olhar, sentir, conviver com a história chocante e, ao mesmo tempo, tão diferente e corajosa, do povo Xukuru.

O túmulo de Xicão fica localizado no meio de pedras altas, onde, por sua vez, as árvores altas cobrem tudo e dão uma sombra e um clima refrescante. O túmulo está no meio desta área, onde, com o passar dos anos, foram sepultados várias lideranças Xukuru. Por último, o jovem Xukuru que dava a sua vida para salvar o cacique Marquinho (Foram 2 assassinatos: os jovens Ailson e Nelsinho, o outro jovem assassinado nesta emboscada, foi do povo Truká e foi sepultado no meio do seu povo).

Todos os túmulos são bastante simples: contendo o nome, o retrato do falecido, e as datas de vida. Com toda a convicção sente-se que os mortos estão vivos e estão presentes, aqui e nesta hora... Quem quiser comunicar-se com eles, só depende de nós e da nossa firme vontade... eles estão dispostos a nos guiar, ajudar e conduzir ...

Marquinho falou de cada um destes heróis aqui sepultados, sendo semente para todos nós e fortalecendo a sua luta e garantindo a sua vitória... Passamos ? uma hora neste lugar aconchegante, mas, ao mesmo tempo, também exigente e/ou desafiante para cada um de nós visitantes.

Voltando deste encontro, paramos na casa de D. Zenilda, que nos acompanhou na visita à aldeia Pé de Serra, cujo líder é o Prof. Agnaldo. Tínhamos combinado de se encontrar ? às 9h na casa de Agnaldo, mas já eram 11h quando chegamos nesta casa/escola. Agnaldo nos recebeu cordialmente e conversamos, demoradamente, sobre a educação do povo Xukuru. Assim constatamos que todos os professores são escolhidos e aprovados pelas lideranças Xukuru, mas são pagos pela Secretaria da Educação do Estado de Pernambuco. Isto, sem dúvida, garante que sejam preservados os critérios fundamentais para a educação do povo Xukuru, garantindo, desde já, a continuidade da história e das tradições deste corajoso povo indígena. Mostrou nos, também, o material didático que está sendo usado nas escolas indígenas Xukuru, onde, atualmente só há possibilidade de fazer o ensino fundamental (de 1º ao 8º ano). Quem quiser continuar os seus estudos e realizar o curso científico, tem de se deslocar para a cidade Pesqueira. A Secretaria de Educação, do Município de Pesqueira, dispõe de transporte coletivo para garantir o transporte dos alunos, mas mesmo assim, o respectivo aluno precisa ainda andar muito a pé para chegar ao ponto de ter acesso ao transporte escolar.

Foi interessante quando Agnaldo colocou a necessidade urgente da insistência de diversas lideranças em concluir o diagnóstico, atualmente em andamento no meio do povo Xukuru. Devido à nossa falta de compreensão deste trabalho, ele explicou que o objetivo principal é conhecer toda a área deste povo, através do levantamento minucioso em todas as famílias de suas 25 aldeias, perguntando sobre a situação financeira, educacional, religiosa e cultural de cada membro da família, que ao todo são mais de 3.000 famílias.

Este diagnóstico está sedo discutido já faz 3 a 4 meses. Foram feitas 4 reuniões, sempre com a intensiva participação dos membros da comunidade. Foi acordado que os técnicos do SERTA (Serviço de Tecnologia Alternativa), de Glória do Goitá, ajudarão na orientação e condução destes trabalhos. Já foi feita a primeira amostragem em diversas famílias e, foi combinado em reunião realizada durante o mês de novembro, de efetuar a 1ª etapa do diagnóstico no início de dezembro. Além disso, ficou determinado que todos os professores Xukuru, juntamente com estes técnicos, formarão um grupo de efetivação de pesquisa o que significa que haverá mais de 100 núcleos de pesquisas. Cada núcleo terá a integração de vários Xukuru (lideranças, jovens e adultos, conforme a disponibilidade destes) e cada núcleo terá, pelo menos 3 integrantes.

As despesas iniciais são custeadas pela Associação do Povo Xukuru, aguardando um posterior financiamento de outra entidade, o que ainda não foi acertada, portanto está aguardando um patrocinador.

O objetivo deste diagnóstico é conhecer, o quanto mais, todos os detalhes de seu povo, seus modos e meios de vida, como também as suas aspirações e perspectivas. A meta é intercambiar com todos os seus componentes e fazer com que todos se sintam ainda mais responsáveis pelo destino e obrigação na realização dos objetivos traçados em comum. A metodologia, por sua vez é contar com a capacidade, a disponibilidade, e a ação de cada um, e principalmente dos técnicos e dos professores, para garantir, primeiramente o êxito deste diagnóstico, mas principalmente em conduzir, as etapas seguintes que deverão ser decididas a partir da constatação da realidade.


Na frente da casa de Agnaldo tínhamos visto o caminhão grande. Já sabíamos que é o único meio de transporte coletivo do povo Xukuru. Fomos informados que, atualmente, este caminhão é usado para transportar, além de merenda escolar (dado pelo Governo Federal e entregue em Pesqueira ou Arcoverde (distância de 30 ou 80 km respectivamente) a todos as escolas públicas), também a ração alimentar para os animais dentro das diversas comunidades. Pois, atualmente há um período de grande seca, haja vista que já deveria ter iniciado o período de chuvas. Portanto, é com este caminhão que também são transportados, tanto as palmas e o capim, como ainda outros tipos de ração para animais, para poder garantir a sobrevivência dos animais dentro das comunidades indígenas. Agnaldo explicou, ainda, que geralmente, se cobra uma taxa de manutenção do uso deste caminhão, mas atualmente a situação está ficando bastante crítica, pois a ração (principalmente palmas) também precisa ser comprada. Tudo isto dificulta muito a possibilidade de garantir o sustento dos animais e, por isso, muitas das vezes, este transporte tem de ser feito gratuitamente, pois os respectivos criadores não dispõe de nenhum dinheiro para pagar o combustível; o que, por sua vez, torna o sustento deste caminhão sempre difícil.


A partir deste comentário, Agnaldo falou, também, sobre o problema da seca. Atualmente, muitas famílias tem de buscar a pé a sua lata de água potável até com 6 km de distância, pois na própria comunidade não há mais reservas e o açude público está seco e precisa ser consertado.

Nesta época de verão e de seca castigante, muitas famílias, tanto as mulheres, como também os homens e até os jovens e crianças, trabalham em artesanato. Assim trabalham em renda, em madeira, como também na confecção de colares e outros tipos de roupa. Há bastante dificuldade em comercializar estes artesanatos, pois só há mercado fora, o que significa que os vendedores tem de se ausentar, financiar viagens e hospedagens, sem terem a garantia de encontrar os seus compradores.


Manfred, no meio destas colocações, também levantou a questão da língua do povo Xukuru. Quem é que ainda fala este idioma?

Primeiramente o Prof. Agnaldo tentou nos explicar que nunca se tratou de um idioma separado, ou autônomo. Teria sido muito mais como se fosse um dialeto, embora, até uns 20 anos atrás, seu uso tivesse sido proibido violentamente pelos antigos fazendeiros (posseiros de terras dos Xukuru) que tentavam acabar com tudo que era próprio deste povo e aqui, tinham a língua (ou dialeto) como mais manifesta expressão. Informou-nos então, que, realmente, tentou-se, como ainda se tenta reviver esta característica própria, mas falar o idioma, no sentido restrito, só tem 2 ou 3 pessoas que o ainda dominam e falam, mas também somente entre si. Os professores se esforçam muito para poder ensinar pelo menos certos termos ou certas palavras que são, então, mais divulgados no meio de todos. Acha, porém, que será bastante difícil reerguer este dialeto para ser falado novamente, ou poder servir de meio de comunicação, restrita aos indígenas Xukuru. O que pode ser notado que, no meio de uma conversa de indígenas Xukuru, muitos usam certos termos na língua antiga. Isto, por sua vez, é principalmente para dificultar a compreensão dos estranhos e, assim, hoje ainda se consegue que algumas expressões sejam mais em uso o que deve ser mais reforçado, o que está sendo feito durante o ensino fundamental nas suas escolas.

Todos nós visitantes ficamos impressionados com os trabalhos da equipe de educação, pois, notava-se que este trabalho é bastante abrangente. Uma vez que a educação perpassa todos os setores da vida e da convivência, sentimos como esta equipe se esforça para dar conta de sua missão árdua, mas de suma importância para todos os membros do povo Xukuru.

Depois deste 'passeio' bastante enriquecedor voltamos para a casa de Marquinho. Depois do almoço, este novamente preparado por D. Zenilda, fomos de carro para assistir e, talvez, até participar do ritual sagrado: o Toré do povo Xukuru. Fomos de carro para a aldeia Vila de Cimbres, e dali distante uns 2 km chegamos ao local do ritual. Ao chegar constatamos que o ritual já tinha começado, pois também já eram 4 horas da tarde. Tinha muita gente reunido em redor do 'santuário', onde se realizou o Toré. Este constitui-se numa pedra, enfeitada com galhos verdes e diversas flores, que nos levava para o Grande Deus Tupã. O Mestre de cerimônias já tinha dado início ao ritual, através de seus cantos, acompanhado pelo ritmo indicado com os maracás. É um ritmo que envolve facilmente qualquer pessoa e convida, por si mesmo, para ser acompanhado por cada um dos presentes.

Depois de terminado esta parte do ritual, o líder desta comunidade, convidou o Cacique Marquinho para usar a palavra. Marquinho, inicialmente, saudou todos os presentes e elogiou a forte vontade de participar sempre mais da vida, enfrentando qualquer dificuldade. Falou, então, de suas últimas viagens, principalmente da viagem a Brasília na semana passada. Explicou que durante o próximo ano haverá mais recuperações de suas terras, pois o Governo Federal se comprometeu em liberar mais verbas para as indenizações das benfeitorias dos posseiros ocupantes de terras dos Xukuru. Disse assim: vamos conseguir todas as nossas terras, muitas delas até agora ainda ocupadas por pessoas estranhas à nossa vida. Vamos organizar, sempre mais as nossas próprias vidas, não dependendo de ninguém, pelo contrário podendo ajudar, também, aos nossos parentes a fortalecer nossos costumes e tradições. Portanto, irmãos, nós fazemos a nossa história! Foi bastante aplaudido e notava-se o grande carinho que os presentes tem no seu corajoso, embora jovem líder e cacique Marquinho.

Em seguida, o cacique Marquinho convidou os visitantes para chegarem no centro, ao lado dele. Pediu a Aloys para apresentar o grupo dos visitantes. Aloys, por sua vez, começou pelo Prof. Dr. Manfred, apresentando-o como seu Pai espiritual, pois fora o orientador dele durante os estudos de doutorado, na Alemanha. Informou os presentes sobre os muitos trabalhos que o Manfred está realizando, tendo sido o último como consultor do Banco Mundial em Brasília. Em seguida apresentou a Profª. Elisa, dedicada aos trabalhos sociais, em diversas comunidades de Aracaju, principalmente a partir de sua universidade, a Universidade Federal de Sergipe. Também apresentou os seus sobrinhos Paulo Eduardo e Ana Sávia, ambos estudantes e com muita vontade de realizarem um trabalho digno para melhorar estas situações de miséria e fome, de grandes injustiças, ainda reinando no nosso meio. Finalmente apresentou, também o seu filho André, atualmente concluindo os seus estudos de Mestrado em Políticas Públicas, na Universidade Federal de Natal, já conhecido de muitos pelas suas freqüentes visitas ao povo Xukuru.

Cada um de nós, então, dirigimos algumas palavras aos presentes amigos Xukuru. Cada um a sua maneira, mas de muito amor e gratidão, por termos podido participar destas cerimônias e do ritual sagrado, o Toré.

Terminadas as nossas falas, o Mestre de Cerimônias retomou a palavra. Neste momento fomos surpreendidos, pois significava uma surpresa agradável para cada um de nós: fomos convidados para dançar o Toré na aldeia de Cimbres - na mata de Vila de Cimbres! Com muita alegria, como também bastante emocionados juntamo-nos ao povo Xukuru e dançamos, todos juntos, no ritmo dos maracás.

Já estava perto de escurecer quando terminou este ritual e voltamos, cada um, para a sua casa. Houve antes, a despedida de cada um com o outro, seja amigo Xukuru, ou visitante, cada qual levava o abraço forte e carinhoso a cada um dos presentes. É, realmente, um ritual emocionante e fortificante.

Chegando, novamente, na casa de Marquinho, tinham chegado Ângelo, companheiro conhecido e já apresentado inicialmente neste relato, juntamente com o colega Saulo Feitosa, atual vice-presidente do CIMI. Estes estavam voltando do povo Truká, com a missão difícil de discutirem soluções viáveis e possíveis, e conseguiram encontrar, em conjunto, algumas soluções imediatas para a grave problemática daquele povo.

À noite, perto das 10h., houve, então a festa do aniversário da namorada de Marquinho e um novo reencontro com vários amigos já conhecidos, ou também parentes do povo Xukuru

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Segunda-feira


Logo cedo Aloys fez um passeio pela área da antiga fazenda Santa Clara, conversando com alguns dos moradores, que já conseguiram fazer várias plantações, com irrigação, de verdura, banana ou de outras fruteiras.

Às 7h. todos nós estávamos prontos para iniciar a nossa volta a Recife, passando antes ainda por Glória de Goitá, já tomados café e tendo arrumado as nossas bagagens.

 

Antes de iniciarmos a nossa volta foi sugerido por Marquinho realizar uma pequena reunião de avaliação da nossa visita. Nos reunimos na sala com todos os presentes. Interessante foi observar que tinham vários jovens Xukuru presentes. Estes, conforme a disponibilidade de cada um, mas principalmente em conformidade com a importância da viagem do(s) líder(es) são incumbidos a darem assistência nestas viagens. O tempo livre destes jovens é estar à disposição do grande líder Marquinho e, consequentemente do(s) seu(s) representante(s) e dar ou garantir, enquanto for possível, segurança e tranqüilidade na execução da missão às lideranças.

Em primeiro lugar falamos nós visitantes. Cada um de nós agradeceu a cordial hospitalidade, mas confidenciando, com bastante convicção, as fortes impressões que recebeu aqui que implicarão num presente e futuro compromisso em compreender sempre mais, mas muito mais em defender, no nosso meio de trabalho e vida, a causa indígena e, principalmente, as justas causas da luta pela digna sobrevivência do corajoso povo Xukuru. No final falaram D. Zenilda e Marquinho. Agradeceram a nossa compreensão, também em desculpar possíveis falhas ocorridas, mas afirmando que precisam, realmente, do nosso apoio. Este apoio é vital para eles e significa a garantia da vitória da sua causa. A luta que com a recuperação das terras no seu território parecia se tornar mais fácil, está se tornando cada vez mais árdua, complicada e arriscada. É preciso a união de todos, tanto dos integrantes do povo Xukuru, como também dos seus 'parentes brancos', amigos de coração e de confiança, mesmo que estes morem em outros países e em situações bastante diferentes.

Então, chegou a hora da despedida. Estávamos, realmente, com saudade deste encontro. Passamos pela casa de D. Zenilda, onde também nos despedimos dos amigos lá residentes, como p. ex. o Vice-Cacique Zé de Santa e seus familiares, como dos vários vizinhos que ali moram. Mas, para esta segunda-feira de manhã, tínhamos já outro encontro marcado, uma visita ao SERTA - Serviço de Tecnologia Alternativa, situado em Glória do Goitá, apenas 60 km distante de Recife. Portanto era hora de irmos embora.

Na saída, quando estávamos na estrada de barro, entre a casa de D. Zenilda e a porteira de entrada para o território deste povo, de repente, surgiu um carro na nossa frente, nos obrigando a parar. Era um carro prata, tipo desta nossa Blazer, diferente no sentido que os seus vidros estavam todos revestidos, de maneira que não dava para enxergar ninguém dos seus ocupantes. O nosso motorista, Paulo Eduardo, parou o carro, apreensivo e nervoso, pois parecia um assalto, mas não tinha como escapar, pois estávamos encurralados pelo carro preto na nossa frente que impediu a nossa passagem. Um homem forte, de meia idade, descia do carro e pertinho do nosso carro vestia a jaqueta da PF : Polícia Federal. Outros ocupantes desciam em seguida, rondando o nosso carro, ao todo 4 ou 5 policiais, todos agora identificados com a jaqueta da Polícia Federal.

Paulo Eduardo, embora nervoso, ficou bastante calmo, respondendo todas as perguntas. As perguntas eram sobre o nosso destino, com o itinerário da nossa viagem. Além disso, queriam saber quem éramos nós, os viajantes. Foram respondidas todas as perguntas e nós fomos liberados para continuarmos nossa viagem. Mas todos nós sabíamos que o Delegado da Polícia Federal já estava ou estava para chegar na área, com a finalidade de interrogar o cacique Marquinho. (Só para lembrar: o mesmo delegado que faz o inquérito é também o encarregado de dar proteção ao Cacique Marquinho contra as ameaças de morte) Queriam saber se o cacique viajava conosco e, possivelmente, impedir a sua saída.

Apreensivos seguimos a nossa viagem, pensando nas enormes dificuldades deste corajoso povo e, principalmente, do cacique do povo Xukuru, o jovem Marquinho...!


A viagem correu sem problemas. Pelas 11 h. estávamos chegando em Glória do Goitá e, consequentemente, no SERTA - Serviço de Tecnologia Alternativa. O SERTA é uma Instituição, de caráter não lucrativa, que trabalha em convênio com várias prefeituras vizinhas e tem como objetivo principal a formação de adolescentes e jovens do meio rural. Esta formação, tanto teórica como, e principalmente, prática, é executada por técnicos especializados que tem na sua frente o conhecido Sr. Moura, diretor desta instituição. Ao mesmo tempo o SERTA também foi escolhida como Centro do Documentação de todas as escolas de tecnologia alternativa, no âmbito da América Latina.

Depois de uma ligeira visita às instalações no setor administrativo fomos convidados para almoçar. É um refeitório grande, em parte tipo varanda, pois o clima aqui é de sertão, é muito quente e seco. Almoçamos com os jovens, futuros agricultores, mas que já produzem grande parte das verduras e carnes consumidas aqui. Durante o almoço tivemos muitas informações, tanto de jovens aprendizes, como também de outros diretores, como p. ex. Sebastião e Roberto, que almoçaram conosco.

Depois do almoço, fomos visitar o sítio desta escola. É planejado e executado, não para copiar por igual, mas receber e ter a partir destas instalações modelos a serem intendidos e, então, transformados em soluções para o próprio sítio. Quem nos guiou foi, inicialmente, o próprio Sr. Moura e, depois, o Sr. Sebastião, o diretor técnico do SERTA. Todas as instalações são, aparentemente, muito simples, entretanto, muito bem planejadas e executadas, principalmente para fornecer idéias e sugestões como garantir uma vida digna e justa para o homem que vive de sua agricultura, sua fruticultura e sua criação de animais. Em primeiro lugar, precisamos da nossa terra, por isso toda a terra está coberta com uma camada de mato seca, ou cobertura morta. Isto, tanto para evitar uma maior seca, mas principalmente para favorecer que os microorganismos possam se desenvolver e termos, sempre uma terra bem rica em nutrientes. Pois é a terra que nos fornece todas as frutas. Mas também tem criatório para porco, cabra e vaca, como também de coelho e preares, e ainda de galinha, pato, guiné e ganso. Aprende-se, facilmente como conseguir mudas, das mais diversas fruteiras e hortaliças, e também como cuidar da horta orgânica, inclusive como obter o adubo orgânico dos próprios meios disponíveis em qualquer sítio. Nada se perde, nada é jogado fora, pois tudo é aproveitado de alguma maneira. Devemos fazer tudo para que os animais trabalhem para nós, que a terra trabalhe e nos forneça o necessário e ainda consigamos algum excedente para vendê-lo e assim, termos, sempre tudo o necessário para a família, para a casa, como também para o lazer de cada um.

Terminada desta interessante excursão pela natureza protegida e incentivada a ser natural e orgânica, quer dizer, em conformidade com seu meio ambiente, fomos convidados para a sala do Sr. Moura, onde debatemos, por mais 2 horas, a problemática desta educação rural diversificada, mas sobremaneira necessária para o meio rural.


O SERTA é reconhecida a nível regional, nacional e até internacional, tanto que recebeu recentemente o troféu de reconhecimento ao ser escolhido como sendo uma das 2 melhores escolhas com técnica alternativa no Brasil inteiro. A sua dificuldade principal consiste em garantir seu funcionamento contínuo e tranqüilo, pois constantemente faltam as verbas necessárias para assegurar o seu funcionamento. Os órgãos públicos até que reconhecem a sua validade e o apoiam, também financeiramente. Mas, muitas vezes, estas verbas chegam com muito atraso, colocando em risco toda a infra-estrutura desta instituição.

Todos nós, mas principalmente Manfred fez muitas perguntas, se interessando muito nas questões educacionais rurais, como também em compreender, mais a fundo, como se explicam as grandes dificuldades financeiras. O Sr. Moura, com muita paciência, explicou a freqüente fragilidade política em que vivemos, levando a estas situações, lembrando que palavras bonitas não efetuam uma educação rural no seu dia a dia, mas sim a garantia e a continuidade sem interrupção, como também a disponibilidade de muitos técnicos e educadores. Exige-se uma constante revisão e um sempre crescente aprofundamento em todas as questões de vida, sempre a partir da realidade (crua e nua) do homem do campo daqui, desta região e, em comparação, de outras regiões, mas sempre do homem rural, sem prejudicar, em nada, a valorização do homem urbano com todas as suas diferenças. Vale salientar, é aprofundado, sobremaneira, a riqueza cultural, espiritual deste homem do meio rural que é compreendido, analisado, valorizado e reerguido, para que tenha, em toda a plenitude, a sua dignidade, o que é a sua cidadania!


Na volta à capital pernambucana, Recife, passamos ainda pela casa do nosso companheiro Chico, para saudar a sua esposa, mas principalmente, para conhecer a filha recém-nascida, agora com 2 meses de idade. Em seguida, fomos para o Mar Hotel, onde tínhamos reservados 2 apartamentos. Passamos aqui até a quarta-feira, quando Manfred retornará para Alemanha. Depois de um banho refrescante, Manfred nos convidou para jantarmos, todos juntos, no restaurante "O Laçador" na beira mar, da praia de Boa Viagem.


Terça-feira


Para este dia estava programado mostrar aos nossos visitantes, Manfred e Elisa, um pouco do patrimônio histórico e cultural em Olinda / Recife. Fomos à cidade antiga de Olinda, conhecendo igrejas famosas, muitas delas no estilo barroco. Também nos deixamos impressionar pela paisagem bela que se tem da Praça da Sé com a bonita vista para a Praia de Rio Doce e redondezas. Fomos também conhecer o Convento de São Francisco, no topo da ladeira que leva para o antigo seminário, onde Aloys passou 2 anos como franciscano, realizando seus estudos de filosofia.

 

Fomos tão entretidos neste passeio histórico cultural que não notamos passar o tempo, de tal maneira que, quando chegamos no restaurante para almoçar já eram 17.oo h. Era o almoço/jantar nesta conclusão de nossa excursão. Neste jantar, Manfred e André escolheram um peixe, que estava exposto e seria preparado ao nosso gosto. Realmente estava uma delícia.

 

Por volta das 20 h, Ana Sávia, Eduardo, André e Elisa reuniram-se com o Prof. Manfred na área da piscina do Mar Hotel para uma conversa sobre as atividades acadêmicas de cada um. Logo no início foi manifestado pelos três estudantes o desejo de manter contato com o professor com o objetivo de que tais contatos pudessem enriquecer seus trabalhos acadêmicos, mais tarde André apresentou sua pesquisa de Mestrado que faz uma análise sobre a relação entre o projeto de Economia de Comunhão e o pensamento marxista, o Prof. Manfred falou em quais universidades alemãs a discussão sobre o pensamento de Karl Marx era interessante e indicou a André a possibilidade deste fazer seu doutorado na Universidade Livre em Berlim, onde a teoria marxista proporcionava discussões bastante proveitosas.

Prof. Manfred ainda fez vários comentários sobre a pesquisa de André citando outros exemplos de comunidades semelhantes ao conjunto de adeptos do movimento folcolare e indicou alguns livros que pudessem auxiliá-lo.


Em seguida, Aloys apresentou o projeto da Instituição UTOPIA "Água é vida", cujo coordenador é Irmão Urbano, em Campina Grande. Utopia é uma entidade que se preocupa, principalmente, com o problema da seca e, aqui especificamente, com o uso e o acesso à água de boa qualidade, para o consumo humano e animal. A partir da realidade da seca, no Nordeste, projetaram e, posteriormente, construíram cisternas e outros tanques para captar água de chuva e preservá-la durante todo o ano. Assim realizaram a campanha "água boa para todos = cada família com a sua cisterna de água de chuva". O programa destas cisternas é, relativamente, bastante simples: se juntam 5 famílias e recebem o treinamento para fabricar as placas da cisterna e construí-la. Depois da construção da 1ª cisterna, sob a orientação do técnico da UTOPIA, as outras 4 famílias também terão a sua cisterna construída, só que será feita pelos próprios componentes (as 5 famílias) desta equipe. E, assim as 5 famílias terão a sua própria cisterna que garante água de boa qualidade suficiente para passar todo o período de seca. Irmão Urbano pede a intermediação de Manfred para garantir e ampliar este programa, para que todas as famílias possam ser beneficiadas com estes reservatórios de água de chuva, água de boa qualidade para o consumo humano e animal.

Encerramos as nossas discussões depois de meia-noite


Quarta-feira: dia da volta de todos


Na Quarta-feira, pela manhã, depois do café chegou a vez da nossa despedida:

às 7.40 hs o Prof. Manfred tomou o avião para Alemanha, via Recife - São Paulo, com destino a Berlim;

às 9.oo hs. André pegou o ônibus para Natal;

às 12.oo hs Eliza viajou no ônibus para Aracaju

Eduardo, Ana Sávia e Aloys voltaram na Van para Campina Grande



Gastos da viagem:


  1. Compra de alimentos para a nossa estada nos Xukuru .......................................................................................... R$ 145,00

  2. 1.097 km rodados x 1 km a R$ 0,70

(para pagamento do combustível e manutenção) ......................................................................................... R$ 770,00

  1. Despesas diversas

(no hotel Mar Hotel, telefonemas, refeições durante as viagens etc.) ................... ...................................................................... R$ 490,00

  1. 5 diárias de Hotel (Bancorbras) pela anuidade de Aloys ................................................................................................................ R$ -,--

 

TOTAL de despesas ....................................................................... R$ 1.405,00

 



Avaliação geral:


Achamos que esta viagem foi bastante válida para todos os participantes. Cada um, à sua maneira, obteve uma visão mais clara de outras realidades, das quais já ouvimos falar, mas sentir e conviver com esta realidade, nos ajudou muito mais, tanto a entender a diversidade, como também em aproveitar para a sua própria vida as lições ou novos encaminhamentos que surgem a partir daí.


Importante lembrar a explicação de Manfred: Para os Xukuru sempre é uma questão de equilíbrio entre Exotismo e Normalidade. Caso se apresentem demais como índios, atraem, para e sobre si, agressões e curiosidade exótica, e, por outro lado, caso se apresentem como cidadãos normais brasileiros e menosprezarem a 'alteridade', então não haverá terra para eles, e a terra para trabalharem precisam comprar ou alugar. Eu acho que tanto Dona Zenilda como também Marquinho dominam muito bem este equilíbrio, como também demonstraram os discursos na formatura e as explicações de Agnaldo, portanto também a formação da juventude visa (e consegue) esta visão e estão conseguindo implementá-la.


Campina Grande, 23 / 12 / 2003



Aloys, Ana Sávia, André e Paulo Eduardo

(de Campina Grande)

 

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